Amarante: os eventos que a pandemia “tramou” em 2020

A pandemia impediu a realização do MIMO, em 2020 (Foto de André Henriques)

Quando, em cada ano, dezembro se aproxima, é inevitável não olharmos para trás, fazendo balanços e conferindo expectativas. Em Amarante, como, de resto, em todo o país, os sentimentos são de negação, muita tristeza, desespero, incredulidade e impotência, perante uma pandemia que não dá tréguas e que segue, impiedosa, o seu caminho.

Há desejos completamente incumpridos, projetos adiados ou destruídos, empregos perdidos, negócios arruinados. Num Município em que o turismo e o comércio têm peso significativo na economia, a crise atingiu ambos profundamente. Compra-se e vende-se muito pouco, os restaurantes diminuíram grandemente a faturação e não há procura no alojamento, garantem fontes ligadas ao setor.

Concelho de muitos eventos, sobretudo ao longo dos meses de verão, Amarante registou, em 2020, um completo apagão nesta área. Desde a festa na mais pequena ermida da serra Marão, até ao mediático MIMO que, desde 2016, aparecia no topo da agenda de espetáculos do país.

A Feira dos Doces Conventuais

Realiza-se na primeira quinzena de maio. Tem para cima de uma dúzia de anos, ocupando, nos mais recentes, os Claustros da Igreja do Convento de S. Gonçalo. Celebra os doces conventuais de Amarante (feitos de lérias, papos d’anjo, foguetes ou brisas do Tâmega), com origem no Convento de Santa Clara (monjas Clarissas) e, durante um fim-de-semana, atrai expositores de todo o país.

As (indispensáveis) Festas do junho

São as Festas da Cidade, em honra de S. Gonçalo. Atraem milhares de amarantinos e incontável número de forasteiros vindos de todo o Norte do país, num ritual que se repete no primeiro fim-de-semana de cada mês de junho. Este ano não se realizaram, para frustração de romeiros e desespero de comerciantes, vendedores ambulantes, donos de carrosséis, de barracas de bugigangas, de venda de farturas, bifanas e pães com chouriço. De regueifa, bolo da Teixeira e de doces fálicos.

Em 2020 não se foi ao Junho. Ir ao junho “é desfrutar do fogo de artifício, subir ao coreto e espreitar a banda, acompanhar as arruadas e os despiques de bombos, envolver-se nas rusgas, é ir para casa quando o sol raiar. É molhar os pés no Tâmega, montar uma guiga e olhar a ponte ao contrário. É entrar na procissão, fé marcada a compasso com a filarmónica, oferecer cravos ao beato, é ser mulher e puxar-lhe a corda do hábito, pedindo marido, com a promessa de que o primeiro filho se chamará Gonçalo. É estreitar de abraços os amigos de fora, que vieram para festa, e que se recebem com verde e presunto. É subir do Arquinho a Santa Luzia e olhar de soslaio as barracas dos doces e reinar com o tamanho dos de S. Gonçalo, alguns para cima de metro, que a imaginação e a ironia não se medem aos palmos. ‘Ir ao junho’ é viver Amarante. É entrar nas tradições e nas vivências do povo que habita a terra e que celebra, orgulhoso, a sua cultura e identidade (in “Um Beato com fama de Santo: S. Gonçalo, história ou lenda?”. Disponível em www.amarantetourism.com).

As Festas de Junho são a maior manifestação de cultura popular de Amarante (Foto AM)

UVVA – Universo do Vinho Verde Amarante

O UVVA realizou-se pela primeira vez em 2016 e “impôs-se” ao público logo no seu ano de estreia. Trata-se de um evento enogastronómico, organizado pelo Município de Amarante e com produção da Essência do Vinho, em parceria com a Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verde.

No UVVA, que atrai aos claustros do Convento de S. Gonçalo muitas centenas de pessoas, os produtores da sub-região de Amarante têm, durante três dias, oportunidade de mostrar as suas marcas, com o evento a incluir provas, showcookings com chefs de cozinha de autor, workshops e conversas sobre vinho.

A Feira à Moda Antiga

A Feira à Moda Antiga é um dos mais genuínos eventos organizados em Amarante. Acontece em finais de junho, na parte baixa da urbe, junto ao rio Tâmega, recreando-se, aí, as feiras do início do século XX. 

Durante um fim-de-semana (com início ao final da tarde de sexta-feira) uma parte da cidade transfigura-se, veste-se “à época”, e contam-se por muitas centenas as pessoas (residentes e forasteiros) que, por causa do evento, a visitam.

O MIMO Festival

O MIMO Festival chegou a Amarante em 2016, trazido por uma produtora Brasileira, Lu Araújo, que queria replicar na Europa um festival que já tinha palco em várias cidades do Brasil (S. Paulo e Rio de Janeiro, incluídas) e que havia nascido em Olinda, em 2004.

Na primeira edição do Festival em Amarante, participaram em atividades do MIMO (espetáculos musicais, concertos, sessões de cinema, workshops, oficinas…) 20 mil pessoas. Em 2019, segundo dados da organização, terão sido mais de oitenta mil.

O MIMO Festival, que, em termos musicais, é construído com base num conceito único (não é pop, não é rock, jazz, blues ou eletrónica ou é tudo isso, apresentado de forma inovadora) é, muito provavelmente, a maior manifestação cultural do norte do país.

Para Amarante, representou, desde 2016, fruto da sua mediatização, um enorme ganho de notoriedade e prestígio, que o mais bem elaborado plano de marketing territorial nunca conseguiria. Coincidindo a realização do MIMO com os anos de ouro do turismo e com a escolha da cidade do Porto (a apenas 50 quilómetros) como “melhor destino turístico”, Amarante passou também a integrar o plano de muitos viajantes e turistas, com naturais reflexos na sua economia.

A Festa Amarantina

Começou por ser uma sardinhada entre vizinhos, todos moradores na Rua da Cadeia. Só que os vizinhos convidavam amigos e, a dada altura, já a casa de nenhum conseguia acolher todos os participantes. A solução foi sair para a rua. Nasceu assim a Festa Amarantina que, desde 2013, se realiza no segundo sábado de julho, com a rua da Cadeia, engalanada, a receber milhares de pessoas.

Caraterizada pelo “no sense”, a Festa Amarantina tem um programa com concertos, exposições e outros eventos, mas nenhum deles acontece. Vive da espontaneidade, do improviso, há música, palhaços, muita animação, mas ninguém recebe cachê. 

O evento mais aguardado da Festa Amarantina, esse sim, preparado com todo o cuidado, chama-se “Grande momento ‘sa Foda”. Acontece à meia noite, quando, das varandas, é atirada sobre os “romeiros” concentrados no Largo de S. Gonçalo, uma chuva de doces fálicos. Geralmente à volta de três mil, disputados um a um, são guardados como troféus e, depois, consumidos com deleite e sarcasmo q.b. por quem teve a sorte de ser contemplado.

Para além destes eventos, a pandemia aniquilou toda a programação cultural da cidade de Amarante, com uma agenda que costuma iniciar-se por abril/maio e prolongar-se até final de dezembro. Nas zonas rurais do concelho não houve as tradicionais festas e romarias, em homenagem aos santos padroeiros locais, e em que se recebem os amarantinos emigrados; nem tiveram lugar eventos como a “Feira das Papas de Olo”ou a “Festa do Caldo das Coibes”, em Rebordelo, nas quais a identidade e idiossincrasia dos povos que habitam aquelas aldeias da serra se manifestam.

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